sexta-feira, 5 de agosto de 2011

ADEL põe o Sertão e uma geração de jovens empreendedores na semifinal de Prêmio Internacional

Há dez anos, em 2001, Wagner Gomes era um jovem estudante do ensino médio na Escola São Sebastião, em Apuiarés – município com cerca de 13 mil habitantes no semiárido cearense. Morava na comunidade Monte Alverne, na zona rural, a 12 km da escola, de onde ia e voltava todos os dias de pau-de-arara. Já tinha ido além do que a maior parte dos jovens de sua região e em sua geração conseguiu. E tinha expectativas de um dia trabalhar em um projeto que ajudasse a mudar a realidade de sua comunidade. Outros muitos jovens como ele tinham a mesma rotina em toda a região. E foi a partir dessa oportunidade histórica que nasceu a ADEL (Agência de Desenvolvimento Econômico Local).
Wagner e muitos outros jovens da região conseguiram chegar à universidade. Wagner entrou no curso de Economia da Universidade Federal do Ceará. Outros onze jovens de comunidades próximas da região do Médio Curu, onde fica Apuiarés, também entraram na universidade: em cursos como agronomia, engenharia e geografia. Esse grupo entendeu a oportunidade que tinha nas mãos, de efetivamente contribuir para transformar a realidade de suas comunidades e de suas famílias. Se conseguisse fazer com que todo o conhecimento e todas as ferramentas que estavam aprendendo na universidade fossem utilizados em prol do desenvolvimento local das comunidades rurais do sertão de onde vieram. E foi assim que surgiu a ADEL – jovens empreendedores interessados em contribuir para o desenvolvimento de suas comunidades com seus conhecimentos.
Em 2007 a ADEL foi oficialmente fundada. Hoje, apenas quadro anos depois, já são mais de 600 pequenos produtores rurais beneficiados por programas de fortalecimento da agricultura familiar e estruturação das cadeias produtivas da apicultura e da caprinovinocultura no sertão cearense. A ADEL atende a mais de 20 grupos produtivos, associações e cooperativas rurais de cinco municípios da microrregião do Médio Curu. Com um modelo de negócios inovador, a ADEL oferece capacitação, assessoria e acompanhamento técnico às organizações de produtores, aprimora as técnicas de produção e comercialização, implanta estruturas agroindustriais, apóia a comercialização direta e articula redes de produção, trocas de conhecimentos e acesso a mercados. Além disso, a ADEL está formando 100 jovens empreendedores rurais, para serem agentes de inovação e de animação nos negócios rurais de suas famílias e comunidades. A estratégia da ADEL consiste em aliar empreendedorismo, cooperação e juventude para o desenvolvimento local, endógeno e sustentável das comunidades rurais.
A ADEL alcançou agora um novo patamar em sua história de sucesso, ao ser semifinalista da competição Oportunidades Econômicas para Todos, do Portal Changemakers da Ashoka, com apoio da Ebay Foundation. Foram 893 iniciativas inscritas de mais de 90 países de todo o mundo e a ADEL é uma das 15 semifinalistas. Agora os finalistas da competição serão definidos através de votação popular online. E o voto de cada um será muito valioso para ajudar a ADEL a subir um novo degrau em seu impressionante crescimento, ganhando visibilidade mundial, sendo reconhecido por potenciais parceiros e investidores internacionais. Os vencedores da competição serão escolhidos por um júri de especialistas e receberão um prêmio final de US$ 50 mil. Com mais essa vitória, a ADEL poderá atender a mais agricultores familiares de comunidades rurais no sertão brasileiro.
Para votar acesse http://embed.changemakers.com/competitions/101640?lang=pt-br, visite o site do Portal Changemakers em http://www.changemakers.com/pt-br/todosaotrabalho ou utilize sua conta no Facebook através do link http://apps.facebook.com/changemakers/TOP.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Sobre o crack e gente invisível

Dario de Sousa e Silva Filho *


No início da década de noventa a imprensa se perguntava como o crack não chegava ao Rio de Janeiro. A cidade já era então tristemente famosa pela disputa entre grupos armados de narcotraficantes diariamente repercutida nos noticiários. A droga é um subproduto da cocaína obtido da mistura de sua pasta com bicarbonato de sódio. Trata-se de pedras que são queimadas e inaladas e que tem baixo custo (cerca de R$3,50 por pedra já nos anos 90). O efeito é mais intenso que o da cocaína. O crack age rapidamente, vicia e debilita também com velocidade. Mas o tráfico organizado de drogas impedia sua ampla distribuição no Rio de Janeiro. O investimento do crime-negócio na época era na cocaína e na maconha de pureza e custos variados, embora fossem drogas de grande aceitação em todas as classes.

No final da década de 90, o crack ganhou as ruas do Rio. Inicialmente seu uso estava restrito à população de rua (como o era em outros centros urbanos) e à população jovem das favelas. Era a expansão da estratégia do narconegócio que já então perdia espaço para as organizações criminosas de milícias que exploravam tv a cabo, extorsão e ágio sobre botijões de gás vendidos nas favelas. Se uma política pública de segurança não conseguira eficazmente conter o tráfico armado, a competição pela exploração dos moradores das favelas o fez. Setores da imprensa que antes estavam intrigados com a ausência de crack no Rio chegaram a ver com otimismo o fenômeno das milícias. E deixaram de perceber que o crack chegara ao Rio para manter o capital de giro do narconegócio. A estratégia era perversa, sobretudo por que os traficantes sabiam que os usuários de crack eram os invisíveis da sociedade. No início, nas favelas da Zona Sul, os traficantes obrigavam que meninos de rua e usuários da comunidade consumissem a droga dentro dos limites da favela. O consumo era intenso. Mas não ostensivamente visto. Com o tempo, as “cracolândias” ocuparam espaços liminares sob a mesma capa de invisibilidade da favela: Arredores de linhas de trens, ruínas das fábricas abandonadas no empobrecido subúrbio da Leopoldina. A atual ausência de uma rede eficaz de atendimento a dependentes químicos é o resultado dessa invisibilidade social e política que foi estratégia de negócio e efeito continuado da naturalização da desigualdade.

Hoje o problema divide ativistas e juristas sobre a forma de atendimento ao usuário. Há quem defenda a internação compulsória _ que sem a já referida rede de clínicas seria meramente uma cortina de fumaça para a opinião pública, no entendimento de outros segmentos. Como herança de políticas ruins e um arraigado desleixo da sociedade contra ela mesma, o crack chega a outras classes e deixa de ser um problema exclusivo dos mais pobres. E abre espaço para drogas ainda mais baratas e destrutivas como o Ox, subproduto da cocaína, com efeito ainda mais rápido e viciante, que pode ser fabricado facilmente sem grandes recursos. E em qualquer lugar. Hoje, a cegueira que permite o espaço ocupado pelo narconegócio multinacional parece mais difícil de curar que os dependentes químicos de crack.

* Professor do Programa de Pós Graduação em Ciências Sociais do IFCH/UERJ/Consultor da Rummos e Professor Visitante da Università di Roma II - Tor Vergata Centro di Ricerche Economiche e Giuridiche